Gigi
Gigi, 1958 – Dirigido por Vincente Minnelli
Na cerimônia do Oscar de 1959, Gigi conseguiu a façanha de levar para casa os nove prêmios para os quais havia sido indicado, incluindo o disputado Melhor Filme e ainda uma estatueta especial para Maurice Chevalier. Fruto da colaboração do diretor Vincente Minnelli e do lendário produtor Arthur Freed, este seria considerado o último grande musical produzido pela MGM (e de fato, o último que rendeu dinheiro). Nos anos 60, o gênero continuaria forte nas telas grandes, mas na forma de adaptação de espetáculos da Broadway (cujo ápice foi Amor Sublime Amor em 1961). Na verdade, Gigi nasceu como uma forma de levar a peça My Fair Lady aos cinemas (algo que seria feito de fato em 1964 pela Warner), trazendo a bordo Alan Jay Lerner e Frederick Lowe, os compositores da obra, para escrever o roteiro e compor as canções baseados no conto da francesa Collette.
Gigi atua como uma ponte entre os clássicos e já então considerados ultrapassados musicais da Metro e as suntuosas adaptações da década a seguir. É possível sentir uma nova influência a medida em que as grandes peças de dança características das películas de Gene Kelly e Fred Astaire são substituídas por números musicais integrais para o desenvolvimento da narrativa. Isso faz com que as canções de Gigi representem não apenas um dos melhores trabalhos da dupla Lerner e Lowe como também de qualquer filme musical. As letras inteligentes e bem-humoradas das composições refletem as características dos personagens e atuam como importantes momentos de exposição dos mesmos. Apesar do tom leve, a história esconde uma camada mais sombria – Gigi (Leslie Caron), jovem parisiense de classe baixa é treinada por sua tia para ser uma cortesã para o alto escalão francês. O ponto de conflito é que ela acaba se apaixonando por Gaston (Louis Jordan), o playboy que deveria ser o seu primeiro cliente. A complexa história de amor enaltece a película e faz com que ela fuja da artificialidade de outros filmes do gênero. Tudo isso reforçado pelo uso de locações da verdadeira Paris, suntuoso design de produção e figurino de Cecil Beaton e da radiante atuação de Leslie Caron. Só mesmo Minnelli poderia se safar fazendo um musical sobre prostituição sem mencionar a palavra uma só vez (e ainda levando um Oscar). E impossível não pensar duas vezes quando um Maurice Chevalie de 60 anos começa a cantar Thank heavens for little girls...
Disponível em DVD pela Warner em versão mutilada para o formato 4x3. Recomendo o ótimo Blu-ray restaurado lançado recentemente nos Estados Unidos.
A Caldeira do Diabo
Peyton’s Place, 1957 – Dirigido por Mark Robson
Filme baseado em um romance escrito por Grace Metalious que se tornou best seller por abordar temas como sexo na adolescência, incesto, aborto e rebeldia juvenil - é uma longa lista! O desafio aqui é levar tudo isso para as telas em uma época em que o código de censura (the Hayes Code) ainda dominava Hollywood, algo que o filme consegue com moderado sucesso. Indicado para 9 Oscar (sem levar nenhum), A Caldeira do Diabo possui um parentesco próximo com os melodramas produzidos pelo diretor Douglas Sirk no mesmo período, mas sem a classe e a sofisticação dos filmes do mesmo. O roteiro não deixa esconder as origens pulp do livro, com muitas passagens parecendo terem sido extraídas diretamente de romances populares vendidos para jovens adolescentes.
A narrativa se assemelha à À Sombra de uma Dúvida de Alfred Hitchcock e Veludo Azul de David Lynch, na medida que mostra a camada podre por trás de uma cidadezinha interiorana dos Estados Unidos. Lana Turner é Constance MacKenzie, mulher viúva com uma filha adolescente (a inexpressiva Diane Varsi) e um passado misterioso. Logo ela se vê confrontada com a explosão sexual da jovem e também da trágica história da amiga adolescente que é abusada pelo padrasto. Muitos tapas, lágrimas, corridas escada acima e soluços em travesseiros se seguem nas duas horas e meia de filme. O maior predicado de A Caldeira do Diabo é fazer com que a história se mantenha interessante e não seja arrastada pela longa duração. Também se torna curioso ver assuntos tão polêmicos abordados no cinema dos anos cinqüenta, ainda que a execução deixe a desejar. Já uso do formato de tela larga CinemaScope não ajuda muito, pois os cenários têm aparência barata e parecem terem sido feitos para um programa de televisão.
Disponível em DVD pela Fox.
Sonho de Mulheres
Kvinnodröm, 1955 – Dirigido por Ingmar Bergman
Em uma produção do início de sua carreira, o diretor sueco examina um de seus temas favoritos: a psique da mente feminina. Mais uma vez o cinema de personagem do mestre domina, e examinamos o dia de duas mulheres de personalidades distintas, mas com problemas amorosos semelhantes. A jovem e superficial modelo Doris (Harriet Andersson) abandona o namorado pobre e se deixa encantar por um senhor de idade que lhe enche de presentes. Já a segura e profissional fotógrafa de moda Susanne (Eva Dalbeck) tenta dar continuidade ao caso que tinha com seu amante casado, apenas para ser puxada à realidade pela esposa do mesmo.
Como o título sugere, Sonho de Mulheres joga a luz sobre a alma feminina, sendo que os homens da história são figuras fracas que deixam seus destinos serem controlados pelas mulheres em sua volta (uma bela composição mostra o marido de costas para a câmera cercado pela esposa e amante em primeiro plano discutindo o seu futuro). Como é característico do diretor, o lado escuro da personalidade humana também é posto em envidência, expondo até mesmo a face sombria de suas protagonistas. Assim como a história, o filme é uma produção minimalista, sem o uso das composições ousadas que marcariam a obra de Bergman e sem mesmo apresentar uma trilha sonora. O que realmente prevalece é a maestria em sua direção de atores e o seu domínio sobre a forma cinematográfica. Um filme menor mas não menos importante.
Disponível em DVD pela Versátil Seleções.
Confissão do dia: Espero deixar a preguiça de lado e voltar a atualizar o blog frequentemente.